sexta-feira, 2 de abril de 2010

Poema Cora Coralina




Um lindo poema da Cora Coralina

Meu companheiro de vida será um homem corajoso de trabalho,
servidor do próximo,
honesto e simples, de pensamentos limpos.
Seremos padeiros e teremos padarias.
Muitos filhos à nossa volta.
Cada nascer de um filho
será marcado com o plantio de uma árvore simbólica.
A árvore de Paulo, a árvore de Manoel,
a árvore de Ruth, a árvore de Roseta.
Seremos alegres e estaremos sempre a cantar.
Nossas panificadoras terão feixes de trigo enfeitando suas portas,
teremos uma fazenda e um Horto Florestal.
Plantaremos o mogno, o jacarandá,
o pau-ferro, o pau-brasil, a aroeira, o cedro.
Plantarei árvores para as gerações futuras.
Meus filhos plantarão o trigo e o milho, e serão padeiros.
Terão moinhos e serrarias e panificadoras.
Deixarei no mundo uma vasta descendência de homens
e mulheres, ligados profundamente
ao trabalho e à terra que os ensinarei a amar.
E eu morrerei tranqüilamente dentro de um campo de trigo ou
milharal, ouvindo ao longe o cântico alegre dos ceifeiros.
Eu voltarei...
A pedra do meu túmulo
será enfeitada de espigas de trigo
e cereais quebrados
minha oferta póstuma às formigas
que têm suas casinhas subterra
e aos pássaros cantores
que têm seus ninhos nas altas e floridas
frondes.
Eu voltarei...

(Cora Coralina)

Resenha do Livro “ A Insustentável leveza do Ser”

Este espetáculo de livro eu li faz tempo, mas conheci muita gente que simplesmente leu duas e até três vezes. Reler um livro soa meio que como um mito. Mas não é não, concordam?

Há livros que simplesmente devem ser lidos mais de uma vez. Nesta obra-prima de Kundera — A Insustentável Leveza do Ser — além de visitarmos a cidade de Praga (invasão russa em Tchecoslováquia), temos a especialíssima companhia de personagens incríveis, e também de Nietzsche, Parmênides de Eléia, Sartre e o mais maravilhoso: temos vez por outra o próprio escritor a nos fazer companhia, conduzindo-nos sabiamente pela filosofia, explicando-nos a realidade sinistra de sua história, que se passa em 1968.

O livro foi publicado em 1984 e talvez muitos de vocês tenham assistido ao maravilhoso filme de Fhilip Kaufman, que levou o título de The Unbearable Lightness Being. Trata-se de um romance aparentemente comum, contando a história de Tomas e Tereza e o cenário, o ano – 1968 – tudo contibui fantasticamente para surgir uma que é, sem dúvida, uma das maiores obras-primas de todos os tempos, no quesito literatura-filosófica-história-romance.

A Insustentável Leveza do Ser

Bom, o gênero romance é apenas a âncora para Kundera por em questão a filosofia pré-socrática de Parmênedes que dissertava sobre a relação peso/leveza. Segundo o filósofo, a problemática estava na dualidade do Ser, onde afirmava que esta dualidade surge da presença e da ausência de entidades. Por exemplo, o frio é apenas a ausência de calor, as trevas são a ausência de luz, então, embora estejamos acostumados com o novo pensamento lógico da vida, para este filósofo a relação leveza/peso afirma o peso como ausência, como não não-leveza.

A partir desta teoria (530 a.C – 460 a.C), Kundera constrói Tomas, um personagem que se recusa a carregar o peso da vida, vivendo sem nenhum compromisso com quaisquer problemas sejam de ordem política, nas relações amorosas, enfim, o personagem escolhe ser "leve", ou seja, livre. Mas Kundera nos leva aos poucos à meditação Nietzscheana, quando pondera sobre o Eterno Retorno, teoria que prevê o angustiante vazio para quem assume levar uma vida linear, longe de buscas e aventuras.

Segundo Nietzsche a vida é um eterno retorno, porque precisamos, temos a obrigação de errar e voltar a errar quantas vezes for necessário desde que não cometamos o primário erro humano de levarmos uma vida dentro de um ciclo de mesmices. Esta teoria de Nietzsche nos convence, em suma, a levarmos uma vida de liberdade, uma vida que valha a pena ser vivida.

Trata Kundera, ainda, da questão da Compaixão, sob o aspecto filosófico das línguas germânicas e latinas, Kundera discute a partir dos significados. Através da história, vemos que Compaixão nada mais é que um terrível sentimento de superioridade de um indivíduo sobre o outro que sofre. E na incapacidade egoísta deste indivíduo superior de sentir a dor do outro, faz com que o outro sofra duas vezes sua dor. Kundera utiliza-se desta metáfora para construir a relação de Tomas com Teresa, porque Teresa é uma moça simples, do Interior, enquanto Tomas é um rapaz rico, médico renomado e muito bonito. Mas ainda existe Sabina, mulher com quem Tomas mantém uma realação amorosa de liberdade longe dos padrões pré-estabelecidos. Esta mulher é como se fosse a versão feminina do personagem.

É um livro gostoso de ler, vocês terão a companhia do próprio Kundera que se retira da narrativa muitas vezes para passar para o leitor em que terreno filosófico ele está pisando, na forma de rodapés, no decorrer da história. Fantástico. Obrigatório, porque considero uma pena não termos acesso a Parmênedes, Nietzsche e Sartre. Mas não há mais desculpas, é só ler A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera e através de uma história de romance que se passa em Praga, em plena invasão russa e tenho certeza que este é um tipo de livro que muda nossa vida, desses que, como disse no início lêem-se mais de uma vez. É o que pretendo fazer esta semana. Reler A Insustentável Leveza do Ser.


 

Trechos do livro:

"Um sobre o outro, eles cavalgavam juntos. Iam juntos em direção às distâncias desejadas. Atordoavam-se numa traição que os libertava. Franz cavalgava Sabrina e traía sua mulher, Sabrina cavalgava Franz e traía Franz.

Teresa voltou para casa mais ou menos a uma e meia da manhã, foi ao banheiro, enfiou um pijama e deitou-se ao lado de Tomas. Ele dormia. Inclinada sobre seu rosto, na hora de aproximar os lábios, sentiu em seus cabelos um cheiro estranho. Mergulhou longamente as narinas. Ficou cheirando-o como um cachorro e acabou compreendendo: era um cheiro feminino, cheiro de sexo.

Durante uns vinte anos, sua mulher fora para ele a encarnação de sua mãe…"


 

Boa leitura!!!

Fonte: http:www.lendo.org/

quinta-feira, 1 de abril de 2010

segunda-feira, 29 de março de 2010

Neurocientista e psiquiatra Nora Volkow- drogas e vícios...

A neurocientista e psiquiatra Nora Volkow, 53, foi a primeira mulher a assumir a direção do Nida (instituto nacional dos EUA para o abuso de drogas), em 2003. Eleita pela revista "Time" uma das cem pessoas mais influentes do mundo, foi pioneira no uso da tomografia para investigar o efeito das drogas.

Neurocientista e psiquiatra Nora Volkow, primeira mulher a dirigir o Nida e pioneira no uso de tomografia para estudar vício em droga

Publicou mais de 400 artigos, mostrando que a dopamina tem um papel fundamental em todas as dependências -das drogas ilícitas ao vício em jogos ou compulsão alimentar- e reforçando a ideia de que a dependência é uma doença crônica, que deve ser tratada como tal.

Volkow nasceu no México, na mesma casa em que seu bisavô, o revolucionário russo Leon Trotsky, foi assassinado. Na última quarta-feira (24), esteve em São Paulo, onde realizou uma palestra na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). Leia a seguir trechos da entrevista que a cientista concedeu à Folha.

Como a sra. define a dependência?
NORA VOLKOW - É uma doença crônica e reincidente, que envolve mudanças no cérebro que levam ao consumo compulsivo de drogas apesar de suas consequências devastadoras. A decisão inicial de usar uma droga é voluntária, mas seu uso crônico pode precipitar mudanças cerebrais que comprometem os sistemas de recompensa, motivação e mesmo o livre-arbítrio.

Qual a diferença entre os mecanismos que levam ao vício em drogas e os que levam a outras dependências, como jogo compulsivo?
VOLKOW - Temos evidências de que os mecanismos cerebrais de dependências comportamentais, como jogo compulsivo, são similares aos produzidos por drogas. As substâncias psicoativas interferem nos mecanismos de recompensa, controlados pelo neurotransmissor dopamina. A maioria das drogas aumenta exageradamente a produção de dopamina, o que sobrecarrega o sistema de motivação e afeta circuitos cerebrais como a memória, a tomada de decisões e a motivação. O jogo compulsivo interfere nos mesmos circuitos cerebrais.

O que as tomografias nos contam sobre a dependência?
VOLKOW - Poder monitorar o cérebro em atividade nos permitiu realmente "ver" as mudanças associadas à dependência e seu risco. As tecnologias de imagem são instrumentos poderosos para combater o estigma, ainda muito difundido, de que abandonar o vício é uma questão de vontade. Demonstrar que [a dependência] é uma doença pode levar a uma enorme mudança na visão que médicos, políticos, o público em geral e muitos cientistas têm do vício e do dependente.

São essas evidências que levam a sra. a defender que o dependente não seja criminalizado?
VOLKOW - Não é meu papel dizer à sociedade como lidar com o status legal desses indivíduos, mas posso usar o conhecimento que tenho para informar os responsáveis pelas políticas públicas que a dependência é um distúrbio médico e que os tratamentos para ela funcionam. Pesquisas mostram que tratamentos feitos dentro do sistema prisional reduzem o abuso de drogas e a volta à prisão, o que pode ser uma forma de acabar com o círculo vicioso de abuso de droga e problemas com a justiça criminal.

E qual é sua opinião sobre a descriminalização da maconha?
VOLKOW - Tenho de me ater aos fatos. Não sabemos exatamente o que aconteceria nessas circunstâncias, mas sabemos que, quando uma droga se torna mais disponível, o uso cresce. É o que acontece com o tabaco e o álcool.

Quais são os melhores tratamentos disponíveis?
VOLKOW - Os mais eficazes envolvem o uso personalizado de medicamentos e terapias comportamentais. Em particular, a dependência a opiáceos pode ser tratada com bastante sucesso. Para as dependências severas, necessitamos de um sistema de cuidados crônicos, com a consciência de que recaídas são comuns e devem ser rapidamente tratadas.

E quais são as perspectivas de novos tratamentos?
VOLKOW - Graças à ciência básica, particularmente na área de genética, estamos identificando novos alvos para os medicamentos. Outra abordagem é o uso de medicamentos aprovados para outros usos, mas que podem ser úteis para tratar dependência. As técnicas de imagem cerebral também estão abrindo novas oportunidades terapêuticas. Por exemplo, uma técnica chamada neurofeedback pode permitir que a pessoa freie voluntariamente áreas específicas do cérebro para controlar a compulsão.


 

(IARA BIDERMAN - Fonte: www1.folha.uol.com.br)