sábado, 12 de setembro de 2009

" Maluco Beleza"

Maluco Beleza
Misturando lucidez e maluquez
Enquanto você
Se esforça pra ser
Um sujeito normal
E fazer tudo igual...
Eu do meu lado
Aprendendo a ser loucoMaluco total
Na loucura real...
Controlando
A minha maluquez
Misturada
Com minha lucidez...
Vou ficar
Ficar com certeza
Maluco beleza...

Raul Seixas
(Cantor e Compositor Brasileiro)

Os limites entre a lucidez e a insanidade, de tão tênues, passam despercebidos pela maioria das pessoas. E, mais do que isto, no mundo em que hoje vivemos, de ritmo tão alucinado e frenético, cruzar as linhas que delimitam aquilo que é considerado são para o que chamamos de loucura torna-se tão frequente que a percepção da sanidade e da insanidade foi ficando cada vez mais difícil...

Afinal de contas, quem é louco e quem é lúcido?

Lúcido é o sujeito que vive dentro daquilo que chamamos de normalidade podem dizer muitos. Mas a que normalidade se referem? Aquela que nos leva de casa ao trabalho e do trabalho para casa, num movimento sem fim em que fazemos tudo igual, com pouca ou nenhuma alteração de nossos cotidianos?

Lúcido é quem paga contas, pratica esportes, corta cabelo, escova os dentes, faz compras, muda de emprego, confere o saldo bancário ou vai ao cinema? Normal pode ser considerado o sujeito que ama a vida e não se submete a estereótipos, mantém sua originalidade, dá passos firmes em direção a trajetórias que escolheu por conta própria e que o fazem sentir real prazer em estar vivo, respirando, pensando...

E o louco? Quem é? Pode ser o Chico Picadinho, que corta em pedaços suas vítimas ou o Maníaco do Parque, para citar os casos mais notórios de insanidade, pensam tantos outros. A loucura estaria então nos atos impróprios e, principalmente, violentos...

Mas, e os loucos que oferecem flores e se isolam do mundo por opção, pois não se sentem incluídos? Sua reação, não violenta, não agressiva, denota loucura pela busca de um espaço onde se sintam melhor, onde se percebam dentro... Que tanto há de loucura nisto? E quais são os locais onde se refugiam? Dentro de si mesmos? No meio do mato? Na química que os isola e os aniquila?

Raul estava certo quando dizia que “controlamos” a nossa maluquez e a misturamos a uma esperada “lucidez”... Trazia a tona a lógica tão apropriada e adequada a este milênio, aquela do ditado popular que diz termos um pouco “de médico e de louco”, todos nós...

Mesmo os mais lúcidos já transgrediram e precisam disto como necessitam do ar que respiram... Ainda que diagnosticados como insanos, há muito mais lucidez por trás dos atos de muitos loucos do que imaginamos e jamais nos daremos conta disso, pois não queremos ouvir o que dizem, entender o que pensam, nos dispor ao diálogo com eles...

O certo é que, na vida, não há certos definitivos, assim como, por conseguinte, não é possível definir e estabelecer de forma igualmente definitiva, quem são os loucos e os lúcidos entre nós...

João Luís de Almeida Machado - Editor do Portal Planeta Educação; Doutor em Educação pela PUC-SP; Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP); Professor Universitário e Pesquisador; Autor do livro "Na Sala de Aula com a Sétima Arte – Aprendendo com o Cinema" (Editora Intersubjetiva).

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

O paradoxo do nosso tempo

O paradoxo do nosso tempo na história é que temos edifícios mais altos, mas pavios mais curtos; auto-estradas mais largas, mas pontos de vista mais estreitos; gastamos mais, mas temos menos; compramos mais, mas desfrutamos cada vez menos; temos casas maiores e famílias menores; mais conveniências, mas menos tempo; temos mais graus académicos, mas menos senso; mais conhecimento e menos poder de julgamento; mais proficiência, porém mais problemas; mais medicina, mas menos saúde.

Bebemos demais, fumamos demais, gastamos de forma perdulária, rimos de menos, dirigimos rápido demais, nos irritamos muito facilmente, ficamos acordados até tarde, acordamos cansados demais, raramente paramos para ler um livro, ficamos tempo demais diante da TV e raramente oramos. Multiplicamos nossas posses, mas reduzimos nossos valores.

Falamos demais, amamos raramente e odiamos com muita freqüência; aprendemos como ganhar a vida, mas não vivemos essa vida; adicionamos anos à extensão de nossas vidas, mas não vida à extensão de nossos anos; já fomos à Lua e dela voltamos, mas temos dificuldade em atravessar a rua e nos encontrarmos com o nosso vizinho; conquistamos o espaço exterior, mas não nosso espaço interior; fizemos coisas maiores, mas não coisas menores; limpamos o ar, mas poluímos a alma; dividimos o átomo, mas não nossos preconceitos.

Escrevemos mais, mas aprendemos menos; planejamos mais, mas realizamos menos; aprendemos a correr contra o tempo, mas não a esperar com paciência; temos maiores rendimentos, mas menor padrão moral; temos mais comida, mas menos apaziguamento; construímos mais computadores para armazenar mais informações para produzir mais cópias do que nunca, mas temos menos comunicação; tivemos avanços na quantidade, mas não na qualidade; estes são tempos de refeições rápidas e digestão lenta; de homens altos e de carácter baixo; lucros expressivos, mas relacionamentos rasos; estes são tempos em que se almeja a paz mundial, mas perdura a guerra nos lares; temos mais lazer, mas menos diversão; maior variedade de comida, mas menos nutrição; são dias de duas fontes de renda, mas de mais divórcios; de residências mais belas, mas lares quebrados.

São dias de viagens rápidas, fraldas descartáveis, moralidade também descartável, ficar por uma só noite, corpos acima do peso, e pílulas que fazem de tudo: alegrar, aquietar, matar. É um tempo em que há muito na vitrina e nada no estoque.

Fonte:César Romão em Estórias e Metáforas

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Sentar-se à janela do avião


Era criança quando, pela primeira vez, entrei em um avião. A ansiedade de voar era enorme. Eu queria me sentar ao lado da janela de qualquer jeito, acompanhar o vôo desde o primeiro momento e sentir o avião correndo na pista cada vez mais rápido até a decolagem. Ao olhar pela janela via, sem palavras, o avião rompendo as nuvens, chegando ao céu azul. Tudo era novidade e fantasia.

Cresci, me formei, e comecei a trabalhar. No meu trabalho, desde o início, voar era uma necessidade constante. As reuniões em outras cidades e a correria me obrigavam, às vezes, a estar em dois lugares num mesmo dia.

No início pedia sempre poltronas ao lado da janela, e, ainda com olhos de menino, fitava as nuvens, curtia a viagem, e nem me incomodava de esperar um pouco mais para sair do avião, pegar a bagagem, coisa etal.

O tempo foi passando, a correria aumentando, e já não fazia questão de me sentar à janela, nem mesmo de ver as nuvens, o sol, as cidades abaixo, o mar ou qualquer paisagem que fosse. Perdi o encanto. Pensava somente em chegar e sair, me acomodar rápido e sair rápido.

As poltronas do corredor agora eram exigência. Mais fáceis para sair sem ter que esperar ninguém, sempre e sempre preocupado com a hora, com o compromisso, com tudo, menos com a viagem, com a paisagem, comigo mesmo.

Por um desses maravilhosos 'acasos' do destino, estava eu louco para voltar de São Paulo numa tarde chuvosa, precisando chegar em Curitiba o mais rápido possível. O vôo estava lotado e o único lugar disponível era uma janela, na última poltrona. Sem pensar concordei de imediato, peguei meu bilhete e fui para o embarque.

Embarquei no avião, me acomodei na poltrona indicada: a janela. Janela que há muito eu não via, ou melhor, pela qual já não me preocupava em olhar. E , num rompante, assim que o avião decolou, lembrei-me da primeira vez que voara. Senti novamente e estranhamente aquela ansiedade, aquele frio na barriga. Olhava o avião rompendo as nuvens escuras até que, tendo passado pela chuva, apareceu o céu. Era de um azul tão lindo como jamais tinha visto. E também o sol, que brilhava como se tivesse acabado de nascer.

Naquele instante, em que voltei a ser criança, percebi que estava deixando de viver um pouco a cada viagem em que desprezava aquela vista. Pensei comigo mesmo: será que em relação às outras coisas da minha vida eu também não havia deixado de me sentar à janela, como, por exemplo, olhar pela janela das minhas amizades, do meu casamento, do meu trabalho e convívio pessoal?

Creio que aos poucos, e mesmo sem perceber, deixamos de olhar pela janela da nossa vida. A vida também é uma viagem e se não nos sentarmos à janela, perdemos o que há de melhor: as paisagens, que são nossos amores, alegrias, tristezas, enfim, tudo o que nos mantém vivos. Se viajarmos somente na poltrona do corredor, com pressa de chegar, sabe-se lá aonde, perderemos a oportunidade de apreciar as belezas que a viagem nos oferece.

Se você também está num ritmo acelerado, pedindo sempre poltronas do corredor, para embarcar e desembarcar rápido e ganhar tempo, pare um pouco e reflita sobre aonde você quer chegar. A aeronave da nossa existência voa célere e a duração da viagem não é anunciada pelo comandante. Não sabemos quanto tempo ainda nos resta. Por essa razão, vale a pena sentar próximo da janela para não perder nenhum detalhe.

Afinal, a vida, a felicidade e a paz são caminhos e não destinos.

(Alexandre Garcia)
Blog: Hora do Recreio de Berenice

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Uma ideia em construção...


Lidar com crianças no dia a dia é algo que requer um esforço maior, vai além de um simples olhar...
Quando estamos lidando com crianças de sete anos em diante, ter um manual na cabeceira da cama, não ajuda muito. Alguns apelam até para um consultor, tipo aqueles que sempre têm muitas respostas prontas pra tudo.

Hoje existe até departamento em algumas universidades para que nos tornemos especialista do especialista em determinada área, assunto, com o intuito de entendermos e aplicarmos alguns conhecimentos que são comuns às crianças nessa fase.

Quando falamos sobre o desenvolvimento da criança sempre nos referimos as teorias de Piaget e outros, que na verdade contribui e muito no entendimento de algumas questões por ele estudada. Mas... Essa criança cresce e nem tudo foi explicado, pelo menos a curiosidade persiste.

As crianças de hoje, respondem as questões presentes e atuais de forma diferenciada das crianças das décadas passadas. A surpresa é a constatação que as respostas são tão complexas que chegamos a nos perguntar da onde ela saiu, como se a mesma não coubesse naquela “cabeça de criança”. E ficamos perplexos e mais ainda, muitas das vezes sem respostas.

Assim, começa o desafio dos educadores, pais e dos professores, porque estes habitam, ou melhor, coexistem num mesmo universo e interagem de forma plena, usando todos os recursos existentes na busca de novos elementos.

Quando nos deparamos com um elemento fora de contexto, ao invés de refletirmos, estudarmos, fazemos alarde, no intuito apenas de informar e não de educar.

Uma criança recebe por dia milhões de informações, o que as tornam reféns pelo excesso da mesma. Digo que a falta como o excesso de informações causam a saúde mental da criança um prejuízo enorme.

Na escola as informações são sempre conduzidas através de uma seleção prévia e o que as faz serem direcionadas ao interesse da criança. Estas são utilizadas como mediadora de novos conhecimentos que são gerados como se fosse uma grande “corrente elétrica”, que gerasse novos conhecimentos.

Mas o que difere nas internalizações desses conhecimentos; é que os mesmos sendo bem aproveitados geram cultura, que ora para alguns indivíduos são perceptíveis e para outros não passam de conversa “fiada”.

Infelizmente nem tudo pode ser ensinado, eis outra questão. Sem dúvida o que trazemos no interior do “nosso corpo”, interfere e muito nas nossas escolhas.
E é essa a batalha que os educadores travam hoje: o que é natural (isto é, o que é da natureza humana), e o que é adquirido (o que se adquire no ambiente), independente do meio e da fonte (pessoa).

A ideia a princípio nos leva a retornar a um passado não muito distante. Pensávamos que essas questões já tivessem esgotadas e que não deveríamos mais nos preocupar. Mas o que parece é que ainda temos muito que desvendar. O mistério da mente, a descoberta da importância da memória, vem a contribuir para um novo olhar sobre os aspectos humanos e ambientais.

Acredito que o que devemos ter em mente é que o desenvolvimento humano ainda carece de entendimento, seja no âmbito da esfera psíquica ou no aspecto intelectual. Penso que nem as descobertas de novas tecnologias responderão as necessidades humanas em sua própria concepção. No máximo elas nos absorverão no intuito de amenizar a dor pela falta de compreensão do que seja uma existência plena de sentido e de existir.

Não escolhemos talvez as melhores metodologias de estudo e assim sendo nos desumanizamos diante de tantas perguntas sem respostas. O ser humano - o indivíduo, ainda carece de uma metodologia de trabalho onde o objeto de estudo não seja uma experiência de ego.

Assim, não é tempo de nos aposentarmos das nossas indagações e sim encontrarmos fontes motivadoras de diálogo, de escuta e de respostas.