sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Bullying


Quando eu era criança brincava muito na rua. Sempre com muitas amigas. A noite parecia muito pequena diante de tanta vontade de brincar. Noites essas de verão, onde as famílias se dispunham há passar algumas horas a conversar em suas calçadas.

Essas amigas eram as que iam pra escola comigo. Terrível era agüentar os seus irmãos. Era um grupinho de crianças mais velhas, portanto se achavam. Eles eram brincalhões. Adoravam acordar cedo só pra mexer com as meninas.

Quando eu me atrasava, ia sozinha. Aí, tudo mudava. Alguns deles adoravam implicar. Só que havia um que era terrível, chegava a ser cruel. E quanto mais ele percebia que me incomodava, mais ele fazia. Tinham mania de colocar apelido, zombavam de tudo, inclusive adoravam humilhar as pessoas, não importava a sua idade. Nessa época, achava-se “normal” esse tipo de comportamento. Na verdade acreditava-se que era um comportamento inadequado, coisa de adolescente, um comportamento anti-social que logo, logo iria passar.

Lembro-me que uma vez fui a casa desse adolescente, brincar com a sua irmã. E esperei a mesma na sala. Ele teve a coragem de fazer-me levantar da onde eu estava sentada, porque aquele era o seu lugar. Ele adorava agir dessa forma. Ficava claro o quanto ele se satisfazia com essa atitude agressiva e antipática. Normalmente, ele não aceitava as repreensões como algo natural. Caso essas o acontecessem ameaçava as suas vítimas com gestos e palavrões.

A ansiedade que os jovens sentem com as mudanças que ocorrem no corpo, nessa fase, não é coisa pequena e caso ele não tenha bons valores incutidos, poderá nesse momento interpretar essas mudanças como um ponto fraco. Os pais são os espelhos da criança, já que tudo o que ela faz passa por eles. Perder esse apoio e referências tão fortes nessa idade torna-os vulneráveis. É nessa fase que os adolescentes procuram se identificar com aqueles que para eles será um modelo de “vida”. Isso supõe testar a capacidade, aprender a reconhecer limites e riscos, organizando a sua relação com o grupo, seja o familiar ou social.

Hoje esse tipo de violência é um fenômeno conhecido como bullying, que apresenta conseqüências preocupantes para a saúde física e principalmente emocional de seus atores- tanto faz se são os agressores, as vítimas ou as testemunhas. E o que é pior: a intimidação, o medo e a vergonha tornam-se um pacto de silêncio entre os jovens.

A forma de agredir varia muito: acontece desde agressões físicas, moral, material e até sexual. O motivo que justifica o ato violento, em geral é apenas um pretexto, qualquer coisa que diferencie a vítima: peso, altura, cor do cabelo, religião, classe social ou outras características que sirva ao preconceito.
Atualmente a internet tem sido usada também para esse fim.
O ambiente escolar está cada vez mais sendo palco para essas agressões. E o pior, ouço depoimentos de pais que não sabem o que fazer. Entregam, ou melhor, delegam o poder de repreensão à escola. Desistem literalmente de educar os seus filhos, tamanha a falta de controle sobre a situação.

Por isso, muitas dessas crianças ou adolescentes chegam à escola tendo que aprender a se comunicar, a falar com os seus pares e com os adultos.

O bullying é o exemplo dessa comunicação atrapalhada. Hoje se considera que faz muito mal à saúde, principalmente quando a vítima fica exposta a esses acontecimentos com freqüência, podendo acarretar conseqüências como: fobias, depressão e outros traumas. Além de tornar as suas vítimas pessoas inseguras e de baixa estima.

O que se verifica é que o quanto antes esse quadro for identificado, mais cedo à situação fica neutralizada.

Assim, os casos mais sérios, em geral acontecem com adolescentes, à ajuda médica ou terapêutica será necessária. Portanto, não veja tudo como uma brincadeira, fique mais atenta, infelizmente o ser humano ainda necessita de bons exemplos, seja na família, na escola ou socialmente falando pra ter uma boa convivência.
Essas palavras da Bárbara Freitag ( socióloga brasileira), são muito atuais:
" Os gregos diferenciavam, como sabemos, entre dois conceitos distintos de tempo: cronos e cairós. O primeiro refere-se à passagem contínua do tempo ( donde, cronologia) e o segundo conceito refere-se ao momento certo, maduro, para certos eventos. Há também, no caso da psicogênese infantil, momentos certos ( cairós) para promover o pensamento lógico, a modalidade autônoma e a competência linguística. Sociedades que se omitem e não fornecem as condições materiais e sociais adequadas para as novas gerações nos momentos certos, perdem a oportunidade de criar cidadãos maduros, capazes de assumir com responsabilidade e autonomia suas funções na sociedade".

Ironicamente o tempo de maturação, está precocemente sendo abolida. Não é à toa que as crianças começaram a ter enfermidades de adultos, mais cedo. Enfermidades essas como dores de cabeça, por inesperadas pressões precoces, vindas sempre como forma de superação de um obstáculo.

Os seus direitos de criança estão sendo cada vez mais esquecidos em nome de uma maturidade precoce. A imposição cultural é autoritária e permanente objeto de alienação na cabeça de todos. Quando queremos que nossos filhos se vistam como adultos, estamos sendo tão irresponsáveis quanto a atitude de uma criança. Portanto, ainda há tempo de devolvermos as nossas crianças a possibilidade de vivenciar a infância com alegria, sem preocupações não condizentes a essa etapa de vida, com chances de amadurecer no tempo certo.



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