quarta-feira, 30 de setembro de 2009

" Enquanto houver um adulto lendo, haverá uma criança para imitá-lo"









Ela ocupa a cadeira de número 1 da Academia Brasileira de Letras, já vendeu 18 milhões de exemplares de seus livros e arrebatou inúmeros prêmios literários nacionais e internacionais. Compartilha o sobrenome com o ilustre Machado de Assis, mas rejeita a comparação simplista – “Maria Clara Machado é mais conhecida das crianças do que ele”.
Aos 68 anos de idade, 40 dos quais como escritora, Ana Maria Machado tornou-se um dos grandes nomes da literatura brasileira, mesmo que, quase sempre, escrevendo para pequenos leitores.

A carreira da escritora de “Bisa Bia, bisa Bel” em um bate-papo na XIV Bienal do Livro Rio com Ruth Rocha, outro ícone da literatura infantil no país que também comemora as suas quatro décadas de trabalho. Após o debate, Ana Maria irá autografar cópias da segunda edição de seu “Palavras, palavrinhas e palavrões”, no estande da editora FTD.

Presença indispensável nas bibliotecas escolares e listas de favoritos de leitores-mirins pelo menos desde a década de 1980, Ana Maria não é lembrada com a mesma intensidade nas páginas de resenhas de jornais e internet quanto poderia, mas tampouco se intimida com isso.

“Em todas as bienais, por exemplo, e grandes feiras de livros, o volume de vendas do setor supera (em muito) as vendas de livros para adultos. As tiragens médias de infantis são sempre mais altas do que as de adultos — e a vida editorial dos livros (seu tempo de permanência nos catálogos das editoras, sendo reimpressos e vendidos ou ganhando novas ilustrações e capas após alguns anos) também. Conseguir esse feito com muito menos espaço na imprensa só confirma o vigor do segmento e sua independência em relação à percepção ‘oficial’ adulta”, defende a escritora.

E, como uma boa professora de português, aproveita para puxar a orelha do jornalista: “O Brasil conhece seus autores de literatura infantil. Quem não os conhece são os chamados ‘formadores de opinião’. Um fenômeno interessante, capaz de fazer pensar no que aconteceria com ‘este país’ se ele fosse ajudado por quem tem poder para incentivá-lo”.

Em tempos de MSN, videogames e TVs a cabo, a escritora não engrossa o coro dos que acham que os livros são pobres-coitadinhos no embate com as novas tecnologias. A briga não é de hoje, lembra. Antes, “havia quintais (com árvore, cachorro etc.), brincadeiras na calçada, turmas de rua, todos a atrair a atenção das crianças”. E completa: “O mundo é mesmo muito atraente, para todas as idades. A literatura faz parte dele, é apenas um de seus encantos. Pode ser que os livros percam a disputa e daqui a pouco desapareçam. Pessoalmente, creio que é até mais provável que isso aconteça antes para os adultos e só depois para as crianças, a julgar pelas tendências do setor. E porque enquanto houver um adulto lendo, será um exemplo para a criança que o ama e o deseja imitar como modelo”.

Vão-se os livros, ficam as palavras.

Há pelo menos duas décadas, depois de abandonar o jornalismo e as aulas em colégios e universidades, Ana Maria vive dos livros – tem mais de 200 publicados, entre histórias infantis e adultas e traduções -, mas reforça que, no caso de um eventual desaparecimento dos impressos em papel, sobrarão certamente as palavras. “Há 2.800 anos, lá na Grécia, quando ainda nem se tinha inventado a escrita, Homero ou outros poetas cantavam e contavam ‘A Ilíada’ e a ‘Odisseia’ ao som da lira em palácios de pedra ou em praças diante de templos de mármore deslumbrantes.
Pouco depois, as tragédias de Sófocles, Ésquilo ou Eurípides eram representadas em anfiteatros ao ar livre, construídos para durar. Hoje, toda essa solidez de pedra se desmanchou e só restam ruínas. Mas as palavras continuaram, ainda que seus suportes fossem frágeis tripas de carneiro num instrumento musical, ou vozes de atores se perdendo no ar. Tenho certeza de que, no fim disso que você chama de ‘a disputa pela atenção’ a palavra tem seu lugar inexpugnável”, profetiza.

É por isso que ela acha “válido” – e não temerosas – iniciativas como as da Floresta de Livros da Bienal do Rio e do Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, que usam recursos de áudio, vídeo e computação para tornar a literatura atraente para o público infantil. “As histórias podem ser contadas de várias maneiras. ‘Troia’ pode ser um filme com Brad Pitt. Ou um jogo de videogame. Ou um desfile de escola de samba, como as referências a ela que o Império Serrano fez ao contar a história de Zumbi dos Palmares. São coisas diferentes, ligadas a emoções distintas e produzem formas diversas de transmissão de conhecimentos. Quem se contentar com a mais pobre delas, tem o direito de escolher ficar só com ela. Ninguém precisa lhe enfiar livros pela goela abaixo.”

Fonte: Entrevista da escritora Ana Maria Machado A ruth Rocha na Bienal- " O Globo Notícias".


Um comentário:

Gilberto disse...

Nata,
Quero parabénizá-la pela escolha do tema e pelo conteúdo de sua abordagem.
A leitura deixa fortes marcas na educação de crianças e se bem orientada, com qualidade, ajuda a construir um ser humano melhor preparado para viver em sociedade.
Parabéns pelo seu BLOG.
Um grande abraço.

Gilberto Monforte